Início Tião Prado A estória da Viúva Porcina, por Tião Prado

A estória da Viúva Porcina, por Tião Prado

Tião Prado

Quem não se lembra da famosa novela da rede Globo de Televisão, Roque Santeiro, uma trama dos grandes autores Dias Gomes e Aguinaldo Silva. Dias Gomes também foi marido da importante autora Janete Clair. Essa novela conta a história de um morador da cidade, conhecido por Roque, que depois ganhou o apelido de Roque Santeiro.

A ‘estória’ conta que na região existia um bandido muito famoso por apelido de Navalhada e um certo dia ele mandou avisar a todos que iria entrar na cidade e roubar todos e tudo que o povo tinha, a não ser que pagassem uma boa quantia de resgate. Pois bem, todos se juntaram e arrumaram uma mala bem grande, cheia de dinheiro para entregar ao tal bandido, mas quem seria o responsável pela entrega uma vez que todos morriam de medo do Navalhada.

Ai a ‘estória’ diz que lá do fundo do povão veio um jovem de nome Roque Santeiro, artesão de santos,  magro, muito humilde e se prontificou a fazer a entrega da mala ao famoso bandido. Foi um espanto para todos com a grande coragem do rapaz, mas como todos tinha medo de fazer o serviço ele ficou responsável pelo pagamento do resgate da cidade e de todos os moradores dali.

No dia em que o bando de Navalhada invadiu  a fictícia cidade de Asa Branca, todos os habitantes fugiram apavorados, enquanto Roque Santeiro desapareceu, sendo dado como morto. Logo após o incidente, uma menina que conseguiu sobreviver, disse ter visto o rapaz em uma visão. A notícia se espalhou e Roque, tido como salvador da garota, foi santificado. Uma estátua em homenagem ao herói foi erguida em praça pública e a população logo passou a lhe atribuir curas e milagres. A lenda de Roque Santeiro trouxe fama à cidade, atraiu romeiros e se tornou fonte de lucro e poder para várias personalidades locais

Bem essa parte não está na novela, mas ela é comentada em cordéis, contos, versos e músicas, que naquele dia fatídico, embaixo de muita chuva, o tal Roque foi pagar o resgate a Navalhada e os dois tiveram um grande confronto, uma batalha  onde o pobre Roque foi morto e teve seu corpo e a mala de dinheiro levada pelo ladrão e nunca mais se ouviu falar de nenhum dos dois.

Durante a novela surgiu um casal inusitado: Sinhozinho Malta e Viúva Porcina, que foi apresentada a todos como sendo a viúva de Roque, até hoje não se sabe como, mas se apresentou como tal de certidão de casamento em punho.

Neste meio também apareceu aqueles que, segundo eles mesmos contam, ficaram escondidos e assistiram a grande batalha entre Roque e Navalhada e contaram que a briga foi feia e não sobrou nada de Roque. Passado uns dias, um corpo de um jovem foi encontrado na beira de um riacho e começaram a falar que esse corpo era de Roque e foi enterrado como tal.

Alguns anos depois, uma jovem que tinha uma grave doença afirmou que Roque aparecera para ela e que ele teria lhe dito que a lama poderia curá-la. A notícia logo se espalhou e assim nasceu o mito do santo milagreiro, que amparava seus seguidores, mas que também gerou a ganância dos que queriam tirar proveito da história.

– Foi extremamente inovador, era uma crítica ao coronelismo e ao abuso de poder. Todos creem no Roque e, de repente, tudo aquilo foi uma grande mentira. Sinhozinho arma para se dar bem e inventa a viúva, que era sem nunca ter sido, o que é maravilhoso! – opina o mestre e doutor em teledramaturgia pela USP, Mauro Alencar.

Para agitar ainda mais a cidade, uma amiga de Sinhozinho, a exuberante Matilde, chega a Asa Branca para abrir uma boate. Uma equipe de cinema também aparece por lá para contar a história de Roque nas telonas. O caos está armado.

Um bom tempo se passou, mas para o desespero dos que lucravam, Roque Santeiro não estava morto e resolve voltar para Asa Branca.

E a partir daí a cidade virou uma verdadeira bagunça, pois tinha Mocinha, que era noiva ‘virgem’ de Roque Santeiro, tinha o Beato Salú que era o pai de Roque e tinha ficado fissurado pela historia e vivia na beira do rio falando os milagres do filho ‘morto’, tinha o Zé das Medalhas, que fez fortuna com a estória e vendia santos e medalhas aos montes.

Ai já outra parte da historia que pode ser vista no Gloplay ou canal Viva da Globo.

Então meus amigos, muitas vezes a gente passa a ser a ‘viuva’ Porcina da historia. Aconteceu comigo, nas eleições de 2000 onde fui um dos mais votados para vereador e fiquei fora por causa da legenda. Pode ter acontecido com você que esta lendo esse texto, ganhou na mega sena e foi ver o bilhete era clonado, ficou sem nada, ou com pessoas que compraram terras de grileiros, sem documentos e sem nada, vão lá tomar posse e chega o dono e expulsa todos, algumas vezes na conversa, outras na bala mesmo, saindo pessoas feridas, mortas, isso sempre acontece.

Por isso que algumas pessoas se lançam em projetos audaciosos e ambiciosos, quando vê, ouve falar ou vê de perto, se diz: “cuidado para você não virar a “Viúva Porcina”, ou seja, para não ir com muita sede ao pote e chegar lá no momento do vamos ver, a coisa dá errada.

Contei essa história toda, para dizer que hoje em nosso mundo, passado mais de 37 anos, pois a novela foi em 1985, histórias como essa acontece todos os dias em todos os lugares do nosso país e do mundo.

A mais recente é do ex-prefeito e ex-governador de São Paulo, João Dória. No fundo uma belíssima historia e tinha tudo para dar certo, fez de tudo para trazer a vacina contra a Covid-19,  para combater o vírus em nosso país, lutou, batalhou, correu atrás e desde então enfrentou todos os tipos de piadinhas sem graça e o escárnio público nas redes sociais e virou o inimigo número um de Bolsonaro, que passou a chamá-lo de ‘calça apertada’. A partir daí, Dória saiu do céu e foi para inverno da noite pro dia e todo seu projeto de ser candidato a presidente da Republica do Brasil foi água abaixo, foi por terra e o Dória é o viúva Porcina mais recente.

O texto ficou longo, mas confesso que foi muito apaixonante escrever essa ‘estória’, mas saiba que você tem que acreditar na beleza dos seus sonhos, porque sempre dá certo no final e se não deu certo ainda é porque não chegou ao final.

Tenho dito.

Tião Prado– um contador de Histórias e estórias

Sair da versão mobile