Cerca de 20 especialistas do Brasil vão participar dos grupos de trabalho do IPCC

A aprovação do escopo dos relatórios dos grupos de trabalho ocorreu na 62ª Sessão do IPCC, em fevereiro de 2025. Foto: Arquivo/Secretariado IPCC

Cerca de 20 especialistas do Brasil integram o grupo de 664 cientistas, de 111 países, selecionados pelo Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC) para trabalhar nos três grupos de trabalho do Sétimo Ciclo de Avaliação, que se estenderá até 2029. Eles atuarão como coordenadores de autores líderes, autores líderes e editores revisores.

O Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), por meio da Coordenação-Geral de Ciência do Clima, divulgou os processos de seleção do IPCC e recebeu 84 manifestações de interesse, que foram encaminhadas ao Ministério das Relações Exteriores para efetuar as indicações ao órgão científico da Organização das Nações Unidas (ONU) para mudança do clima.

“É muito relevante a participação da comunidade científica brasileira nos ciclos de avaliação do IPCC, não só representando a ciência nacional e do Sul Global produzida sobre mudança do clima e suas implicações, mas também demonstrando as questões que são peculiares e relevantes para os países em desenvolvimento”, diz a secretária de Políticas e Programas Estratégicos do MCTI, Andrea Latgé.

Segundo dados do IPCC, governos e organizações observadoras acreditadas efetuaram 3.771 indicações. Dos 664 selecionados, 51% são provenientes de países em desenvolvimento e economias em transição, 46% são mulheres.

Para o Grupo I, que aborda a base científica da mudança do clima, foram selecionados oito especialistas do Brasil. Para o Grupo II, que trabalha com impactos, vulnerabilidade e adaptação, foram sete profissionais. Para o Grupo III que aborda a mitigação da mudança do clima foram cinco selecionados. O IPCC não produz ciência, mas revisa e avalia a ciência mais recente disponível.

Projeções climáticas

O pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Lincoln Alves, trabalhará na função de autor líder do capítulo sobre projeções regionais e extremos climáticos. O item integra o escopo do Grupo de Trabalho I e tem nos modelos climáticos a principal ferramenta para sinalizar o que pode acontecer no futuro a partir dos diferentes cenários de mudança do clima. “Vamos olhar as projeções de quanto a temperatura vai aumentar ou diminuir, os extremos climáticos diante de todo esse arcabouço de modelos que, com o enfoque para a escala regional, foram evoluindo ao longo dos últimos anos”, detalha.

Segundo Alves, nos últimos anos, houve avanços significativos da ciência no desenvolvimento de modelos climáticos, permitindo uma maior destreza e resolução espacial. “Os modelos avançaram bastante em termos de resolução espacial. Estamos falando de modelos que estavam na ordem de 100 km. Agora, estamos trabalhando com modelos da ordem de 4 a 5 km”, explica. Para o pesquisador, que está trabalhando como coordenador-geral de Adaptação do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), esses novos dados em escala regional permitirão que os países se apropriem e conheçam melhor os impactos da mudança do clima tanto no presente quanto no futuro.

A perspectiva de Alves sobre o trabalho nos próximos anos é bastante positiva e destaca a importância do número de brasileiros nomeados para contribuir. “É importante destacar o papel da ciência brasileira de uma maneira geral, de produzir o máximo de informação possível para que elas estejam contempladas no relatório”, afirma.

Enfatizar a ação climática

A pesquisadora da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) Maria Fernanda Lemos terá a função de autora líder de capítulo sobre adaptação de assentamentos humanos, infraestrutura e sistemas industriais. “É uma visão mais abrangente sobre assentamentos humanos, não se restringindo apenas às cidades”, explica. Esse ciclo de avaliação do IPCC terá um relatório especial sobre cidades.

Esta é a segunda vez que Maria Fernanda coordenará o trabalho de autores selecionados para elaborar um dos capítulos do Grupo de Trabalho II, que se dedica ao tema da adaptação. No último ciclo do IPCC, ela coordenou o capítulo regional sobre América do Sul e América Central.

Conforme explica a pesquisadora, o trabalho de coordenadora de capítulo temático envolve ter atenção para que o conhecimento sobre o tema contemple todas as regiões do globo de modo que garanta equilíbrio, atenda ao escopo definido e aprovado no âmbito do IPCC, execute uma revisão aprofundada da literatura e que, se possível, possa evidenciar as lacunas de conhecimento.

Outro aspecto do trabalho do coordenador envolve a integração e interface com os coordenadores de outras áreas. “Depois que termina a redação do relatório a gente fica mais tempo trabalhando para elaborar essas sínteses dos relatórios”, sintetiza a pesquisadora.

Maria Fernanda destaca uma atenção maior ao tema da adaptação preventiva e transformativa neste ciclo de avaliação do IPCC diante da emergência climática e uma preocupação em conectar e dar visibilidade a soluções para ter aplicação prática de todo o conhecimento que tem sido gerado. “A gente precisa levar o trabalho do enfrentamento da emergência climática para a ação, enfatizar a ação”, exemplifica.

Impactos, vulnerabilidades e riscos

Pela primeira vez, o coordenador do grupo de estudos de meio ambiente e sociedade do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo, Pedro Jacobi, participará das atividades do Grupo de Trabalho II do IPCC. Ele atuará na função de editor revisor do capítulo sobre impactos, vulnerabilidades e riscos.

Com longa carreira na temática ambiental sob a perspectiva socioecológica, Jacobi destaca que suas expectativas de contribuição com o próximo relatório envolvem enfatizar a importância do diálogo com a sociedade, em termos de articulação social. “Reforçar cada vez mais a importância do diálogo com a sociedade, de criar cada vez mais o empoderamento da sociedade para ser corresponsável”, defende o pesquisador.

Jacobi acredita que esse é um aspecto relevante para fortalecer a gestão em âmbito municipal diante das questões climáticas, em especial eventos extremos, como o excesso ou a falta de água. “As pessoas têm que estar mais organizadas, mais preparadas, melhor informadas, pressionar por transparência da gestão pública para ser mais protagonista nesse processo”, afirma.

O primeiro encontro de autores líderes está previsto para dezembro. Espera-se que os três relatórios comecem a ser publicados em meados de 2028, enquanto o relatório de síntese que concluirá o Sétimo Ciclo de Avaliação está previsto para 2029.

O ciclo também produzirá um relatório especial sobre mudança do clima e cidades, um relatório metodológico sobre forçantes climáticas de curta duração e um relatório metodológico sobre tecnologias de remoção, captura e estocagem de dióxido de carbono.

Fonte: Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação