O Pantanal é outro bioma diretamente ameaçado
Os impactos mais severos da mudança climática estão se consolidando sobre a região Centro-Oeste do Brasil, especialmente em Mato Grosso do Sul. Essa foi a principal conclusão do jornalista Cláudio Ângelo, assessor do Observatório do Clima, durante aula para jornalistas no curso “COP30 em pauta”, promovido pela Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo).
Com base em dados do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) e em estudos brasileiros, Ângelo mostrou que a região da chamada monção sul-americana – que inclui Mato Grosso do Sul, parte do Cerrado, sul da Amazônia e norte do Paraguai – é uma das que mais estão aquecendo no planeta.
A projeção para um cenário de aquecimento de 2ºC até o fim do século é de aumento médio de 42 dias por ano com temperaturas acima de 35ºC na região.
“Estamos falando de locais onde já se vive rotina de 40ºC. Acrescentar mais seis semanas a isso significa comprometer a vida, a agricultura e a infraestrutura”, alertou. Em Campo Grande e Cuiabá, esse novo padrão térmico pode afetar populações urbanas e rurais, com riscos elevados de colapsos de saúde em dias mais quentes.

Cláudio destacou ainda que as temperaturas mínimas no Brasil, especialmente à noite, subiram mais de 2ºC desde a década de 1960. “Não se tem mais noites frias abaixo dos 20 graus no Centro-Oeste. Isso não é só desconforto térmico. É um novo tipo de clima que impõe riscos diretos à saúde, à produção e à segurança hídrica”, afirmou.
O Pantanal é outro bioma diretamente ameaçado. Segundo o jornalista, o ciclo de seca e fogo que se intensificou nos últimos anos tende a se tornar recorrente. O fenômeno é agravado pela perda de umidade vinda da Amazônia, que tem impacto direto no regime hídrico pantaneiro.
“O Pantanal está secando porque a Amazônia está queimando”, resumiu. Ele destacou que os chamados rios voadores, fluxos de umidade que partem da floresta, estão enfraquecendo e ameaçam colapsar o ciclo de chuvas no Centro-Oeste.
Os efeitos já são percebidos na agricultura. Estudos citados durante a aula mostram que parte da soja cultivada no Cerrado já está fora das condições ideais de clima para produtividade, e projeções até 2060 indicam que a maior parte da região não conseguirá sustentar duas safras por ano.
“As sementes que usamos hoje foram desenvolvidas nos anos 1970. Elas não estão preparadas para um mundo que esquenta 55 graus no solo”, disse.
Ângelo também criticou a ausência de dados confiáveis sobre mortalidade por calor no Brasil, especialmente no Centro-Oeste. Na Europa, explicou ele, a correlação entre mortes e ondas de calor começou a ser feita de forma sistemática após 2003, quando 70 mil pessoas morreram durante três meses de verão. “Aqui nós já vivemos em lugar quente, e por isso as mortes pelo clima extremo não são devidamente atribuídas ao calor.”
A aula fez parte do módulo sobre impactos da crise climática no Brasil e suas consequências locais. O curso da Abraji tem como objetivo preparar jornalistas para a cobertura da COP30, que ocorrerá em 2025 em Belém (PA).
Cláudio finalizou com um aviso: “Não é mais uma questão de prevenir. Já estamos dentro do colapso e precisamos relatar o que isso significa para quem está no centro dele”.
Fonte: Campograndenews