24.8 C
Ponta Porã
domingo, 5 de maio, 2024
InícioNotíciasProsa com Especialistas: Entrevista com Monique Rodrigues da Silva, fonoaudióloga

Prosa com Especialistas: Entrevista com Monique Rodrigues da Silva, fonoaudióloga

POR JULIANA RAUZER

O QUE DEVO SABER SOBRE O DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM?

Nossa colunista educacional, a Psicopedagoga Juliana Rauzer realizou uma agradável entrevista com a Fonoaudióloga Monique Rodrigues da Silva objetivando esclarecer as principais dúvidas que muitas famílias possuem quando o assunto é o desenvolvimento da linguagem.

Prosa com Especialistas: Entrevista com Monique Rodrigues da Silva, fonoaudióloga

Monique Rodrigues da Silva é Fonoaudióloga há 11 anos, mãe, estudante de medicina. É a minha primeira convidada do Prosa com Especialistas por ser uma profissional competente, atualizada e preocupada, assim como eu em transladar informações essenciais às famílias que tem a incumbência de educar e assessorar suas crianças em cada etapa do desenvolvimento infantil.

Dou início à nossa entrevista questionando:

Monique, o que pode causar uma alteração fonoaudiológica nos primeiros anos de vida?

A princípio, a introdução alimentar inadequada.  Posteriormente no mesmo sentido de alimentação a presença de seletividade. Isso no primeiro ano é o que leva os pais a procurarem apoio fonoaudiológico. Por volta de 18 meses (1 ano e 6 meses) onde se evidencia as alterações no desenvolvimento da linguagem, sendo nessa fase perceptível algumas características de atrasos. Atualmente recebo muitas crianças com dificuldade na aceitação de novas texturas devido à queima de etapas.

O desenvolvimento infantil funciona como uma escadinha, onde cada processo favorece o próximo. Caso haja um déficit na introdução alimentar ou preferência por texturas específicas como o pastoso, por exemplo, acarretará em prejuízos musculares onde alguns fonemas serão prejudicados.

Monique, sabemos que por volta dos seis meses de vida podemos fazer a introdução alimentar. É ideal que ofereçamos legumes, frutinhas amassadas, batidas, raspadas, correto? Mas também é importante ressaltar que conforme a criança vai crescendo e evoluindo devemos também deixar a alimentação mais consistente?

Sim. De acordo com as respostas motoras da criança pode ir dificultando o processo aos poucos. Precisa realmente seguir um método, na qual vamos inserindo novas texturas a partir do momento em que a criança torna-se capaz de realizar aquele movimento seja ele de ejeção do alimento, ou de preparação do bolo alimentar.

O sólido é consequência de uma boa maturação motora, ou seja, precisamos passar pela etapa de sugar o leite materno onde ocorre fortalecimento da musculatura intra-oral, em seguida apresentamos o pastoso e pastoso com grumos para somente então chegarmos a fase sólida. Se alguma etapa não for respeitada a criança pode sofrer engasgos, pois neurologicamente ela não foi preparada para ir do liquido para o pastoso com pedacinhos de alimento.

Temos uma idade para inserir os alimentos sólidos?

Tudo vai de acordo com o desenvolvimento da criança, isso pode acontecer por volta dos dez meses a um ano de vida. Se uma criança mamou na mamadeira, por exemplo, pode apresentar mais dificuldade em passar por esse processo, pois a mamadeira é “mais fácil” de ser sugada que o peito.  

Monique, muitos profissionais são contra o uso de chupetas. Por qual razão?

A chupeta ou qualquer outro corpo estranho inserido na boca altera a anatomia intra-oral, modificando a posição dos órgãos fonoarticulatórios. Os dentes ficam maus projetados, o palato (céu da boca) fica mais alto e ogival, a língua em repouso fica em posição de assoalho da boca, o que a deixa mais flácida, dificultando a articulação adequada de alguns fonemas.

Eu preciso de dentes, língua, bochecha, palato para ter um posicionamento anatômico funcional, tudo encaixado no devido espaço uma vez que coloco o dedo, a chupeta, ou o hábito de roer unhas eu estou alterando a estrutura típica daquele espaço. Alguns sons como o L o T, precisam de movimentação da língua de cima para baixo e é aí que criança começa a desenvolver alterações fonêmicas por conta de uma má postura da língua, dos dentes. 

Monique, quais são as principais características de atrasos que são identificadas no início do desenvolvimento da fala?

Atraso simples de linguagem oral, desvio fonético, desvio fonológico, apraxia de fala na infância, distúrbios do processamento auditivo, entre outros.

Monique, algumas famílias não sabem até quando é considerado “normal” falar com omissões e troca de letras. Existe uma idade limite?

Cada idade precisa adquirir e desenvolver fonemas específicos. Uma criança de 18 meses que não emite P, M e B, por exemplo, já precisa de ajuda. Posteriormente temos o grupo de fonemas que precisam ser adquiridos com 24 meses, depois 36 meses e assim por diante até os cinco anos onde nessa fase todos os fonemas já precisam estar instalados e sistematizados. Uma criança que passa pela primeira fase de aquisição, no caso 18 meses sem adquirir o P, por exemplo, terá dificuldade de evoluir no processo seguinte para os outros fonemas como o T, D, N. Eu sempre faço analogias à escada. Um processo depende do bom desenvolvimento do anterior.

Como Psicopedagoga, percebo no dia a dia do consultório que a maioria das crianças que apresentam desvios fonológicos findam por escrever como falam. Como é o trabalho da fonoaudiologia convencional para fazer com que a criança perceba a diferença de fonemas?

O trabalho envolve a consciência fonológica. Eu preciso entender o fonema para conseguir transcrever para o grafema. E mostrado de forma pontual todos os sons, ponto articulatório para que a criança perceba a execução e entenda algumas diferenças. Por exemplo, ela quer me pedir um prato e fala pato, podemos mostrar a imagem de um pato e dizer: você quer isso? Obviamente que ela vai dizer que não, que quer um prato, mas vai pronunciar pato. Você pode dizer para ela que o que ela falou foi pato, pode até gravar ela falando, então podemos super articular aquele som. PARATO. Assim ela entende que existe um som ali depois do P. o R vibrante. Naquele momento de aquisição a criança precisa entender o som, por isso fazemos a super articulação, depois vai suavizando a articulação até chegar ao som do prato, onde todos os fonemas estão juntos.

Monique, super articulação seria pronunciar individualmente cada fonema?

Sim. Individualmente e de forma exagerada.  Por exemplo, uma criança que fala BASIL no lugar de BRASIL é necessário super articular os fonemas isolados para que a criança entenda os pontos de articulação B-R-A-S-I-L, é  um trabalho complexo, porém temos bons resultados para sistematização em poucas sessões.

Monique É mito ou verdade que a criança que “fala errado” após os 5 anos vai apresentar Dificuldade na alfabetização?

Não é  uma regra, mas nos apoiamos na linguagem oral para desenvolver a escrita. O método fônico de alfabetização se baseia no som individual de cada consoante. Se uma criança apresenta alteração fonêmica ela com certeza levará a mesma troca para a escrita.

Monique, Por isso a importância de levar em um profissional para avaliação antes da alfabetização caso seja identificado desvios/dificuldades fonológicas, não é?

Sim, o diagnóstico precoce sempre é o melhor caminho, porém a importância de termos professores desde a educação infantil atento a cada fase de desenvolvimento é  fundamental. Eles estão em contato direto com as crianças. Os professores são os primeiros observadores. Quando temos professores capacitados em identificar o “diferente” tudo fica mais fácil.

Grande consideração Monique. Além da psicopedagogia eu tenho o prazer em estar em sala de aula e me sinto responsável pelo desenvolvimento dos meus educandos.

Mais uma pergunta: Você já atendeu casos em que pensou: chegou tardio para mim, se tivesse vindo antes o processo seria mais fácil?

Diariamente. Tem famílias que esperam literalmente por um milagre. A escadinha do desenvolvimento precisa ser respeitada, aquele processo que falei lá atrás que se inicia aos 18 meses pode virar uma bola de neve caso não seja identificado precocemente. A criança chega com sete anos sem ter instalado nem os fonemas iniciais.

Qual o seu recado para as famílias?

Está percebendo que seu filho está com o processo de aquisição demorado, procure ajuda o quanto antes. Não adianta esperar. Não existe milagre, existem tratamentos que podem facilitar essa consciência do som e articulação adequada.

Monique eu vejo algumas famílias esperando… Talvez haja uma esperança que com a idade “x” vai do nada começar a falar tudo corretamente. E como tu bem disseste não existe mágica, existe tratamento e como todos, quanto antes iniciar, melhor!

Juliana, se a criança está fora do que é esperado para sua idade já precisa de ajuda imediata. Cada pessoa é única, mas há marcos de desenvolvimento comum a todos. As dificuldades podem surgir desde muito cedo aos seis meses  podemos ser acionadaspara ajudar na introdução  alimentar, ou ao um ano para estimular o balbucio. Enfim, está fora dos marcos de desenvolvimento tem que procurar ajuda.

Vamos compartilhar com vocês um quadro que auxilia as famílias a identificarem a idade de aquisição de cada fonema:

Prosa com Especialistas: Entrevista com Monique Rodrigues da Silva, fonoaudióloga

Uma criança de um ano e seis meses precisa pedir água, falar papai e mamãe, se não, há algo errado. Existem os marcos de comportamento verbal, que são primordiais que a criança adquira antes do desenvolvimento da linguagem efetiva. Temos tanto para falar, o que é primordial para a criança na fase inicial de sua vida é contato visual, brincar funcional, imitação motora, imitação gestual…

 Monique agradeço teus esclarecimentos, já lhe convido para mais um Prosa com Especialistas, pois realmente temos muito o que falar. A importância do brincar é fundamental para o desenvolvimento infantil, se mais famílias soubessem disso, talvez veríamos menos crianças com dificuldades.

Juliana, tem crianças que não sabem pegar nos brinquedos, e isso é integração sensorial de desenvolvimento infantil. É através de brincadeiras como imitar o som do carrinho “bruuuum, brummmm”, que a linguagem surge, através de  onomatopeias, o “ toc toc” da porta, o boneco que cai: “pennnn”,  o “piu piu” do passarinho estão fazendo parte da construção dos fonemas.  As crianças precisam brincar, precisam de alguém para mostrar o modelo daquele som, se não ela não se desenvolve.

Já atendi casos de crianças que aos 3, 4 anos não falavam nada, e faltou apenas ser exposta a uma comunidade verbal. Coloquei um carrinho na mão da mãe e não sabia brincar imitando os sons para ele.

Com certeza Monique esses estímulos são fundamentais. Fica aí o tema para o nosso próximo encontro. Agradeço sua disponibilidade e agracio imensamente a Dora Nunes, Tião Prado, jornalistas pioneiros do nosso tão amado Ponta Porã Informa pela oportunidade de levarmos informações aos nossos estimados leitores.

Até a próxima.

Juliana Rauzer da S. Sousa

Pedagoga, Psicopedagoga, Neuropsicopedagoga Especialista em Educação Especial e Psicologia Escolar