Stalking: assassino rastreou, perseguiu e difamou jornalista por 20 dias

Assassino de Vanessa a vigiou por 20 dias nas redes, quebrando a senha dela - Fotomontagem

Vanessa Ricarte, indica Gaeco-MS, foi vítima de perseguição virtual, chantagens, exposição íntima e cárcere antes de ser morta com facadas pelo noivo.

Um “festival de horrores”. É assim que a jornalista Vanessa Ricarte, 42 anos, descreveu para uma colega de trabalho como era viver constantemente ameaçada, vigiada e difamada com seu noivo, Caio César Nascimento Pereira, 34 anos, entre os dias 23 de janeiro e 12 de fevereiro.

A descrição dos dias de tormenta que antecederam o assassinato de Vanessa está em um relatório feito pelo Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado (Gaeco), a partir do monitoramento dos equipamentos eletrônicos de Vanessa, Caio e também das contas de serviços digitais com armazenamento em nuvem.

O monitoramento do Gaeco mostra que o músico que matou Vanessa com várias facadas no peito, em 12 de fevereiro último, havia aprisionado a jornalista em um sistema de ampla dominação psicológica, também definido como “ciclo da violência”. 

“O stalker monitorava os contatos profissionais e as amizades da vítima, questionando-a incessantemente, cobrando explicações, exigindo retorno imediato à residência e proferindo ofensas, bem como pedindo perdão e demonstrando arrependimento, em postura manipuladora amplamente conhecida como ciclo da violência¹ (fase 1 – evolução da tensão; fase 2 – incidente de agressão; fase 3 – comportamento gentil e amoroso – e tudo se repete)”, explica a promotora de Justiça Ana Lara Camargo de Castro no relatório, que descreve o comportamento abusivo de Caio.

No documento, há prints de conversas no WhatsApp, em que Caio oscilava entre mensagens como “obrigado por apostar em mim, você é uma mulher incrível que Deus colocou na minha vida”, e mensagens em que exige que ela volte para casa com urgência, questiona insistentemente o que ela faz em determinados lugares, entre outras ordens.

Caio, conforme o Gaeco, se apossou das senhas para acessar a conta da Apple de Vanessa e conseguia monitorá-la em tempo real por meio de mecanismos de rastreamento via GPS criados para a segurança dos usuários, mas que o músico usava para perseguir a vítima.

O telefone de Vanessa, um iPhone, e um Apple Watch eram constantemente espelhados na tela do computador de Caio, que exigia que a vítima lhe informasse em tempo real o que fazia.

Vanessa era assessora de imprensa do Ministério Público do Trabalho, na Rua Dr. Paulo Coelho Machado, em frente ao Shopping Campo Grande, e, em uma das ocasiões, ele exigiu explicações da vítima sobre o que ela estaria fazendo no shopping. A demora dela em se explicar o deixou em descontrole, com várias mensagens. 

Pelo apurado pelo Gaeco, no entanto, houve apenas uma imprecisão de localização, pois Vanessa sequer havia deixado o local de trabalho.

Fotos íntimas

O assassino, ao sentir que perdia o controle sobre a vítima, que vinha sendo aconselhada a procurar a polícia, chegou a praticar o que, no mundo on-line, se chama de “revenge porn”. Ele postou fotos e vídeos dela nua, sem consentimento, na conta dela do Instagram e até no portal de pornografia Xvideos.

Os especialistas do Gaeco comprovaram que uma conta aberta por Caio fez as postagens e criou perfis que simulavam ser de Vanessa.

“Eu sofri violência doméstica, psicológica, difamação, exposição indevida de fotos. Então, assim, eu passei a madrugada na delegacia. Eu fui na Casa da Mulher Brasileira registrar um boletim de ocorrência. O cara tá dentro da minha casa ainda e eu vou ter que voltar para a DEAM agora, porque eu vou pedir escolta para tirar ele de lá. E assim, foi grave”, disse Vanessa a uma colega de trabalho, em conversa também analisada pelo Gaeco.

Vanessa não teve a escolta que desejava. Apesar de seus relatos, uma investigação da Corregedoria da Polícia Civil não encontrou culpados no mau atendimento recebido por ela.

“Então eu consegui tirar meus computadores, tirei meu celular. Fui mantida em cárcere privado ontem, foi assim um festival de horrores. O cara me chamou de atriz pornô desde os 19 anos. Depois eu conto toda a história para você, mas nesse momento eu não consigo, não tem nem psicológico (…)”, desabafou Vanessa à amiga.

Vanessa era obrigada por Caio a fazer ligações de vídeo, até mesmo enquanto dirigia, para comprovar sua localização.

Ela morreu no dia 12 de fevereiro, enquanto Caio ainda a monitorava. Depois de ter tirado o computador de casa, ela ainda tentava retirar outros pertences de lá. Não teve a escolta que esperava ter. Até voltou para casa em companhia de um amigo. Não conseguiu: foi covardemente atacada por Caio, que a matou com facadas no peito.

Caio foi preso em flagrante desde então. Atualmente, responde pelo assassinato de Vanessa, por abuso psicológico, e ainda pela tentativa de assassinato do amigo dela.

Fonte: Correio do Estado