Em Ponta Porã, “Favelinha” anuncia um grande curto circuito, mas Energisa aumenta a carga de eletricidade

O cenário se parece mais com uma teia de aranhas, com fios de energia elétrica espalhados por todos os lados

26/09/2019 18h50 – Jornal Che Fronteira

É um problema recorrente e que fica maior a cada dia. Tem autoria, tem causas e conseqüências, tem uma infinidade de ações questionáveis, tem vítimas e uma série de riscos iminentes à segurança pública, mas, não tem culpado.

O cenário se parece mais com uma teia de aranhas, com fios de energia elétrica espalhados por todos os lados, muitos amarrados em postes improvisados e até em galhos de árvores, o que permite inclusive aos mais otimistas, prever que o local se prepara para ser palco de um grande curto circuito, ameaçando patrimônios e, o pior: muitas vidas humanas.

O tema desse imbróglio interminável não poderia ser outro, senão a ampliação rápida e sistemática da ocupação irregular da (já foi instituída popularmente) “Favelinha da Ferroviária”.

Conta a lenda, que o movimento iniciou-se por volta do início de 2013, para pressionar a Administração Municipal que assumia e que as pessoas que foram “convocadas” para fazer parte do virtual “movimento de luta pela moradia” acabaram gostando da idéia e as pequenas tendas de lona plástica foram dando lugar a barracos de madeira, outros de alvenaria e, hoje, a “Favelinha” já tem casas com garagem, redes de água e energia elétrica, bares, mercadinhos, imóveis para alugar e, é lógico”, muitas “bocas de fumo”.

Não há rede de esgotos, é claro, já que o “bairro” sequer existe de direito. Mas, existe de fato e a ocupação irregular, a qual todos, indistintamente, já reconhecem como irreversível, cresce sem critério algum e numa velocidade assustadora.

Resumindo, a situação é essa: a área pertence à União. A América Latina Logística S.A. (ALL), concessionária de toda a rede binária em todo o Brasil, abandonou Ponta Porã diante da desativação da linha férrea e do natural desinteresse econômico pelo ramal fronteiriço. Quando consultada, sequer se dignou a se manifestar a respeito. Segundo a Procuradoria Geral da República em Ponta Porã, a ALL devolveu a concessão e a gestão do local ficou sob responsabilidade do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), que, a grosso modo, sequer sabe onde fica Ponta Porã.

Todavia, é um problema social, de saúde e de segurança pública que acabou no lugar de sempre: no colo do atual prefeito, o arquiteto Hélio Peluffo Filho (PSDB) que está de “mãos atadas”, já que, mesmo consciente de que a “Favelinha” precisa de uma solução urgente, nada pode fazer enquanto a União não proceder o repasse oficial para o município.

A “Favelinha” precisa de um cadastramento de quem mora ali, do registro de imóveis que se enquadrem nos requisitos legais e, de uma obra de urbanização, já que as “ruas” (que têm até placas com nomes: Sabiá, Bem-Te-Vi, Pardal, etc.) não passam de “trilheiros” alargados que permitem o trânsito de veículos, porém, completamente assimétricas e deslineadas.

CHOQUE

O maior problema, no entanto, é a disseminação das ligações (legais e clandestinas) de energia elétrica. Para tentar conter o crescimento da ocupação, há mais de um ano, a Prefeitura Municipal, através da Procuradoria Geral do Município, oficiou à Sanesul (Empresa de Saneamento Básico de Mato Grosso do Sul) e à Energisa (Concessionária de Energia Elétrica), solicitando que não fossem mais efetuadas novas ligações de água e de energia elétrica naquela parte da cidade.

Mas, tanto uma como a outra, continuam agregando novos cavaletes e padrões às redes de abastecimento, à revelia dos apelos manifestados pelo município. Na verdade, as duas empresas exigem do consumidor, na hora de solicitar uma nova ligação de água ou eletricidade, a escritura do imóvel, ou o contrato de aluguel.

Porém, os invasores encontraram uma solução legal para o que pode ser considerado um direito do cidadão: o acesso à água e à energia elétrica. Isso, através de intervenção da Defensoria Pública. Ou seja, o cidadão se apresenta, acompanhado de testemunhas e, muitas vezes, com toda a família “à tira-colo”, alega que ocupa um imóvel na “Favelinha” e que precisa de água e luz na casa.

A Defensoria Pública, por sua vez, elabora o que é juridicamente denominada “Ação de Obrigação de Fazer”, como explicou em entrevista ao Jornal Che Fronteira, nesta segunda-feira (23), a titular da 1ª Defensoria Cível e coordenadora da Defensoria Pública Regional de Ponta Porã, Drª. Juliane Lins. Elaborado o procedimento, agora com mais celeridade diante da jurisprudência, encaminha ao juiz e este, embasado na lei e, principalmente no instituído “direito social”, expede ordem judicial para que uma das empresas de abastecimento em questão cumpra a determinação, cujo desrespeito, implica em sérias sanções penais. Tudo isso, sem que quaisquer das autoridades ou gestores mencionados questionem o advento da propriedade ou do registro regular do imóvel.

DIREITO SOCIAL

O acesso à energia elétrica é categorizado como direito social na Constituição. É o que prevê a Emenda à Constituição (PEC) 44/2017, aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pela Presidência da República. O dispositivo garante o seu fornecimento de energia elétrica para qualquer cidadão em todo o território brasileiro.

O acesso à energia elétrica é de fundamental importância para “garantir a dignidade humana”, pois possibilita o uso e acesso de diversos bens e serviços que dependem de fontes elétricas, reza a emenda.

Os chamados direitos sociais referem-se à qualidade de vida dos indivíduos e devem ser garantidos pelo Estado. O artigo 6º da Constituição de 1988 define uma série de direitos sociais, que são regulamentados por outras leis. Entre os direitos previstos estão educação, saúde, alimentação, trabalho, moradia, transporte, lazer, segurança, Previdência Social, proteção à maternidade e à infância e a assistência aos desamparados.

Por fim, compreende-se que o acesso à energia elétrica não se constitui em um direito fundamental autônomo, mas em um direito decorrente do mínimo existencial. O direito fundamental que se associa ao acesso à energia elétrica, e, portanto, o direito fundamental a ser argüido, é o direito ao mínimo existencial, esse sim direito fundamental implícito na Constituição Federal de 1988. Portanto, a postulação da manutenção do acesso à energia elétrica não pode ser ignorada quando dela depender o mínimo existencial, seja em matéria do direito à saúde, educação, moradia, ou qualquer outro direito fundamental, desde que seja comprovada a vinculação e a imprescindibilidade de tal acesso para a concretização e/ou manutenção de tais direitos fundamentais.

Enquanto isso, a “Favelinha da Ferroviária” cresce e aumenta a potência do que pode ser encarada como uma “bomba-relógio”, deixando todos os envolvidos, literalmente, em “estado de choque”. (Edmondo Tazza – MTE/MS 1266)

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