Talvez eu me invente, por Ana Laura, 1º lugar na Bienal Pantanal 2025

Eu não sei se hoje acordei ou se apenas parei de sonhar. Há uma diferença? Seria a vida um sonho lúcido? Então por que eu não acordo dele?

Me busco no meu grande vazio.

Sinto um conforto na dor, no sofrimento, na melancolia de existir. Disseram-me que isso é perigoso. Mas acontece que por eu sofrer, eu me aprofundei pelo coração dentro do coração.

Dentro de mim, a voz que fala não tem boca. Ela é feita de vento e um pouco de medo. E eu – quem sou? Sou uma mulher que observa a mulher que sou.

Quando escrevo as palavras no papel, sinto que o gesto é maior que a escrita. É um aviso: Estou viva. Eu acumulo, acumulo, acumulo, até que não cabe em mim e estouro em palavras.

As vezes penso que o corpo é só um disfarce para a alma não passar vergonha. Outras vezes, acho que a alma é que inventou o corpo para ter a quem culpar.

Hoje, o sol entrou pela janela sem pedir licença.  Fiquei ofendida. Quem ele pensa que é para iluminar tudo assim, tão sem pudor? Mas depois percebi que o sol não sabe o que faz. Nem eu.

Há uma solidão que é companhia. E há uma companhia que é solidão. Talvez o erro esteja em nomear as coisas. As coisas não gostam de nomes, preferem ser sentidas.

Se eu pudesse, arrancaria todos os relógios do mundo. Não para parar o tempo, mas para que ninguém percebesse que ele existe.

Penso no amor como se fosse um copo d’água: às vezes transborda, às vezes evapora. O que me assusta não é o vazio, mas a lembrança de quando esteve cheio.

E se eu nunca for quem espero ser?

E se a espera for, na verdade, o que me mantém?

Talvez… talvez eu seja só uma página em branco, que acredita ser livro.

Hoje, acordei com um peso que não era tristeza. Era só existir demais.

O café esfriou antes que eu tomasse o primeiro gole. Talvez porque, no fundo, eu não quisesse café, mas sim um instante para adiar o dia.

Olhei para minhas mãos e percebi que elas estavam quietas demais. Mãos paradas parecem pensar mais que o resto do corpo.

Há lembranças que se agarram à pele como se fossem tatuagens invisíveis. Por mais que eu lave, não saem. Talvez nem sejam lembranças, mas avisos.

O tempo não é um rio. É um espelho que se quebra toda vez que tento olhar.

Hoje, a rua estava cheia de gente, mas todas as pessoas me pareciam um pouco vazias. Ou talvez eu tenha projetado o meu próprio vazio nelas — o que é pior, porque torna impossível fugir.

Às vezes, penso que o amor é só um intervalo bonito entre dois silêncios.

E às vezes, penso que eu inventei essa frase só para não admitir que tenho medo do próximo silêncio.

Ser é um verbo que não se conjuga sozinho. Mas eu continuo tentando.

E agora, escrevendo, percebo: talvez eu não queira entender nada. Porque entender é matar a pergunta. E eu gosto de perguntas vivas.

Ana Luaris. 2025